29 de Abril/Quinta Feira
Era tarde de um dia de agosto de 2008. Acabara de ser convidado a me juntar, à mesa do almoço num congresso de teologia, a quatro grandes teólogos, pastores e pensadores brasileiros. Subvertendo a imagem bíblica, me sentia como “um leão na cova dos Daniéis”. Rodeado, naquele momento, por dois pastores batistas, um considerado liberal e mais dado à filosofia e o outro quase fundamentalista; um pastor pentecostal histórico, sério e dedicado e um outro pastor, anglicano, amigo de longa data.
Todos à mesa, além de amantes do conhecimento e dos livros, também dispunham de um bom humor invejável, o que tornava o momento agradável e risonho apesar de todas as diferenças. O assunto: teologia! Não poderia ser diferente.
Eu estava ali, um “menino” de 37 anos, “bebendo” do conhecimento e da sabedoria que os anos impunham aos meus “colegas de mesa”, quando a pergunta veio em minha direção: “E você, Junior, fecha com Calvino ou Armínio?” Sem demorar, respondi que não conseguia “fechar” com nenhum dos dois. Ambos me pareciam ter acertos e erros em suas “sistematizações”.
Imediatamente, o pastor pentecostal, homem que já me conhecia há alguns anos disse: “Pelo amor de Deus, Junior... não deixe que estraguem você! Permaneça assim, custe o que custar. Nós já estamos velhos e endurecidos pela ‘teologia’. Ande sempre por esse ‘caminho do meio’. Não se deixe estragar.”
Hoje, início de 2010, essas palavras me vêm à mente quando me ponho a pensar no meu “futuro”. Faltam pouco mais de 6 meses para que eu conclua o curso de Teologia e a pergunta que muitos fazem é: “Qual sua ‘linha teológica’?” Minha resposta continua quase a mesma: não consigo “fechar” com nenhuma das “teologias” que me aparecem.
Por que tenho que ter meu pensamento definido por esta ou aquela escola teológica? Por que tenho que seguir este ou aquele modelo eclesiástico? Não posso aprender um pouco com todos ou até mesmo rejeitá-los, por mais famosos e concorridos que sejam?
Fundamentalismo ou Liberalismo? Fujo dos dois! Fujo do liberalismo que destrói todas as coisas, mas não constrói nada em seu lugar. Isso é covardia! Destruir para não construir é molecagem! É palhaçada! Mas também fujo do fundamentalismo que mantém, linda e adornada, a fachada de um prédio que já está derrubado. Não agüento o discurso “moral e religioso” de gente que usa a religião para dominar, que no fundo, é o desejo do fundamentalista: dominar pela sua “verdade”!
Mas aprendo com os fundamentalistas pelo menos um pouco do respeito pela Palavra. Um pouco, porque a relação do fundamentalista com a Palavra é idolatria! O liberal, por sua vez é iconoclasta e se deleita em derrubar esse ídolo, mas como já disse antes, sem colocar um “Deus” no lugar.
Aprendo com os liberais o diálogo com as ciências, principalmente as sociais. Tomando o devido cuidado para não transformar a prática cristã em “militância sócio-política”. As coisas devem caminhar de mãos dadas, lado a lado, proclamação do Reino de Deus e manifestação da Sua justiça!
Avançando um pouco mais, a discussão do momento parece ser entre o que chamam de Teísmo Aberto e o Fatalismo calvinista. Novamente aprendo com os dois. Olhar para uma mulher com seu filho ainda pequeno, deformado por bombas que explodem pela violência de homens que fazem guerras em nome de Deus e dizer: “Esta é a vontade de Deus. Dê graças!” é zombar do amor de Deus, é ser cruel e legitimar sua crueldade com a sua “verdade”, maior que toda a compaixão e dor que se deveria sentir diante de um quadro como esse. Gosto quando o “teísmo aberto” me dá o direito de dizer “não sei” quando realmente eu não sei e não tenho o que dizer. O fatalista, senhor de todas as verdades, tem respostas prontas para tudo, e, me perdoem, tenho medo de pessoas que têm respostas prontas para tudo. Mas aprendo um pouco também com esse mesmo fatalista, porque também me calo diante da majestade e soberania de um Deus que vai muito além do que penso ou imagino. Talvez não da mesma forma que este fatalista, talvez muito mais como os pais místicos, que se calavam diante do mysterium tremendum.
Não agüento mais também as discussões intermináveis promovidas pela nova onda: os adeptos da “não-igreja”. Descobriram a pólvora! Deus não quer institucionalismo, e em nome disso criam... instituições! Não percebem que o simples reunir de gente resulta em uma “instituição”. É claro que esse momento é o momento propício (graças a Deus!) de repensar as mega-igrejas, os grandes impérios, o Institucionalismo. Mas jogar fora a instituição por causa disso é também um erro. O problema não é a instituição, é o que a faz “girar”... nós!!! Coloque esse monte de gente que se descobriu “livre da igreja” juntos... e o problema permanecerá... numa nova “não-instituição”, mais institucionalizada que antes.
Quanto aos outros assuntos menores, nem me dou mais ao trabalho de discutir: Batismo por imersão ou aspersão? Resposta: Depende da profundidade do Rio. Próxima! Posso ouvir música do mundo? Resposta: Ainda não ouvi música de Marte. E por aí vai...
Quero caminhar no difícil caminho do meio, mesmo sabendo que isso não é o que esperam de um “teólogo”. Quero poder dizer que “não sei”. Quero poder chorar quando não tiver uma resposta. Quero sorrrir ao descobrir a resposta vindo de onde menos se espera. Quero aprender com as crianças, com os poetas, com as mães que sofrem injustiças, com a gente simples que Deus, em sua imensa graça, me der o privilégio e a honra de pastorear. Quero a dúvida como companheira por muitas vezes, porque sei que só em meio à dúvida é que brota a fé.
Termino com minha profissão de fé, que me permito “copiar” de Guilherme Arantes:
“E eu desejo amar todos que eu cruzar pelo meu caminho;
Como eu sou feliz, eu quero ver feliz;
Quem andar comigo, vem...
Agora é brincar de viver!”
Autor: José Barbosa Junior – Rio de Janeiro, 05/01/2010
Fonte: http://www.crerepensar.com.br
Era tarde de um dia de agosto de 2008. Acabara de ser convidado a me juntar, à mesa do almoço num congresso de teologia, a quatro grandes teólogos, pastores e pensadores brasileiros. Subvertendo a imagem bíblica, me sentia como “um leão na cova dos Daniéis”. Rodeado, naquele momento, por dois pastores batistas, um considerado liberal e mais dado à filosofia e o outro quase fundamentalista; um pastor pentecostal histórico, sério e dedicado e um outro pastor, anglicano, amigo de longa data.
Todos à mesa, além de amantes do conhecimento e dos livros, também dispunham de um bom humor invejável, o que tornava o momento agradável e risonho apesar de todas as diferenças. O assunto: teologia! Não poderia ser diferente.
Eu estava ali, um “menino” de 37 anos, “bebendo” do conhecimento e da sabedoria que os anos impunham aos meus “colegas de mesa”, quando a pergunta veio em minha direção: “E você, Junior, fecha com Calvino ou Armínio?” Sem demorar, respondi que não conseguia “fechar” com nenhum dos dois. Ambos me pareciam ter acertos e erros em suas “sistematizações”.
Imediatamente, o pastor pentecostal, homem que já me conhecia há alguns anos disse: “Pelo amor de Deus, Junior... não deixe que estraguem você! Permaneça assim, custe o que custar. Nós já estamos velhos e endurecidos pela ‘teologia’. Ande sempre por esse ‘caminho do meio’. Não se deixe estragar.”
Hoje, início de 2010, essas palavras me vêm à mente quando me ponho a pensar no meu “futuro”. Faltam pouco mais de 6 meses para que eu conclua o curso de Teologia e a pergunta que muitos fazem é: “Qual sua ‘linha teológica’?” Minha resposta continua quase a mesma: não consigo “fechar” com nenhuma das “teologias” que me aparecem.
Por que tenho que ter meu pensamento definido por esta ou aquela escola teológica? Por que tenho que seguir este ou aquele modelo eclesiástico? Não posso aprender um pouco com todos ou até mesmo rejeitá-los, por mais famosos e concorridos que sejam?
Fundamentalismo ou Liberalismo? Fujo dos dois! Fujo do liberalismo que destrói todas as coisas, mas não constrói nada em seu lugar. Isso é covardia! Destruir para não construir é molecagem! É palhaçada! Mas também fujo do fundamentalismo que mantém, linda e adornada, a fachada de um prédio que já está derrubado. Não agüento o discurso “moral e religioso” de gente que usa a religião para dominar, que no fundo, é o desejo do fundamentalista: dominar pela sua “verdade”!
Mas aprendo com os fundamentalistas pelo menos um pouco do respeito pela Palavra. Um pouco, porque a relação do fundamentalista com a Palavra é idolatria! O liberal, por sua vez é iconoclasta e se deleita em derrubar esse ídolo, mas como já disse antes, sem colocar um “Deus” no lugar.
Aprendo com os liberais o diálogo com as ciências, principalmente as sociais. Tomando o devido cuidado para não transformar a prática cristã em “militância sócio-política”. As coisas devem caminhar de mãos dadas, lado a lado, proclamação do Reino de Deus e manifestação da Sua justiça!
Avançando um pouco mais, a discussão do momento parece ser entre o que chamam de Teísmo Aberto e o Fatalismo calvinista. Novamente aprendo com os dois. Olhar para uma mulher com seu filho ainda pequeno, deformado por bombas que explodem pela violência de homens que fazem guerras em nome de Deus e dizer: “Esta é a vontade de Deus. Dê graças!” é zombar do amor de Deus, é ser cruel e legitimar sua crueldade com a sua “verdade”, maior que toda a compaixão e dor que se deveria sentir diante de um quadro como esse. Gosto quando o “teísmo aberto” me dá o direito de dizer “não sei” quando realmente eu não sei e não tenho o que dizer. O fatalista, senhor de todas as verdades, tem respostas prontas para tudo, e, me perdoem, tenho medo de pessoas que têm respostas prontas para tudo. Mas aprendo um pouco também com esse mesmo fatalista, porque também me calo diante da majestade e soberania de um Deus que vai muito além do que penso ou imagino. Talvez não da mesma forma que este fatalista, talvez muito mais como os pais místicos, que se calavam diante do mysterium tremendum.
Não agüento mais também as discussões intermináveis promovidas pela nova onda: os adeptos da “não-igreja”. Descobriram a pólvora! Deus não quer institucionalismo, e em nome disso criam... instituições! Não percebem que o simples reunir de gente resulta em uma “instituição”. É claro que esse momento é o momento propício (graças a Deus!) de repensar as mega-igrejas, os grandes impérios, o Institucionalismo. Mas jogar fora a instituição por causa disso é também um erro. O problema não é a instituição, é o que a faz “girar”... nós!!! Coloque esse monte de gente que se descobriu “livre da igreja” juntos... e o problema permanecerá... numa nova “não-instituição”, mais institucionalizada que antes.
Quanto aos outros assuntos menores, nem me dou mais ao trabalho de discutir: Batismo por imersão ou aspersão? Resposta: Depende da profundidade do Rio. Próxima! Posso ouvir música do mundo? Resposta: Ainda não ouvi música de Marte. E por aí vai...
Quero caminhar no difícil caminho do meio, mesmo sabendo que isso não é o que esperam de um “teólogo”. Quero poder dizer que “não sei”. Quero poder chorar quando não tiver uma resposta. Quero sorrrir ao descobrir a resposta vindo de onde menos se espera. Quero aprender com as crianças, com os poetas, com as mães que sofrem injustiças, com a gente simples que Deus, em sua imensa graça, me der o privilégio e a honra de pastorear. Quero a dúvida como companheira por muitas vezes, porque sei que só em meio à dúvida é que brota a fé.
Termino com minha profissão de fé, que me permito “copiar” de Guilherme Arantes:
“E eu desejo amar todos que eu cruzar pelo meu caminho;
Como eu sou feliz, eu quero ver feliz;
Quem andar comigo, vem...
Agora é brincar de viver!”
Autor: José Barbosa Junior – Rio de Janeiro, 05/01/2010
Fonte: http://www.crerepensar.com.br
Li seu material "O DIFÍCIL CAMINHO DO MEIO"! Parece que você está falando de mim, pois me vi bem dentro dentro do seu texto! Parabéns! Amei!