O Mundo Mudou e a Igreja Também
17 de Março/Quarta Feira

EM MINHA JUVENTUDE jamais imaginei que o mundo ficaria
do jeito que está. Lembro-me claramente do meu assombro
quando ouvi um CD (os primeiros eram enormes), do meu
espanto com a internet e de como me senti diante das imagens
dos confins do universo, geradas pelo telescópio Hubble.
O futuro chegou assustando prognósticos e profetas.
Assisti ao colapso do comunismo soviético, à ascensão da
teocracia islâmica e ao avanço da pandemia da aids na África. Marx
não acreditaria se lhe contassem que os proletários optaram pelo
consumo e arriaram a bandeira socialista em quase todos os países
onde o comunismo foi implantado. Che Guevara ficaria espantado
em saber que a guerrilha pós-moderna acontece no Iraque,
com características muito mais religiosas que ideológicas. Ele
choraria de tristeza se soubesse que os guerrilheiros colombianos
viraram bandidos comuns.
A história dos últimos cinqüenta anos ganhou velocidade, deu
guinadas mirabolantes, e, muitas vezes, homens e mulheres
agiram como se estivessem num estouro de boiada: todo mundo
se atropelando numa correria sem rumo.

A revolução sexual mudou conceitos de família. Os pais
ganharam novos papéis, os adolescentes passaram a procriar
prematuramente e os idosos perderam relevância com o fortalecimento
da indústria da beleza. As relações com parentes imediatos
tornaram-se distantes.
A popularização do Estatuto dos Direitos Universais do
Homem resgatou a luta pela dignidade dos deficientes físicos,
gerou maior resistência ao racismo e alargou o espaço das mulheres
para reivindicarem igualdade.
Em meus verdes anos como cristão, quando divagava sobre o
futuro, não considerava as mudanças que viriam sobre minha igreja.
Dei meus primeiros passos na fé na Igreja Presbiteriana Central
de Fortaleza. Cumpri ritos de iniciação, no batismo, para me
integrar completamente em minha nova comunidade. Fiz de tudo
para enriquecê-la. Evangelizei, organizei congressos de jovens, dei
aulas na escola dominical. Ali, fiz bons amigos que ainda hoje
permanecem como referenciais para mim.
Nossos cultos seguiam rigorosamente a mesma liturgia, sempre
com reverência. A música vinha de um órgão. Cantávamos com
um hinário e depois ouvíamos o coral. As ofertas, trazidas ao
gazofilácio, precediam o sermão de vinte minutos. Ocasionalmente,
fazia-se um apelo de conversão — com poucos decididos.
O culto terminava com um tríplice amém. Como nossa igreja
não era muito grande, nos conhecíamos intimamente. Gastávamos
horas conversando no terraço. Respirávamos um ambiente
comunitário. Muitas vezes, havia fofocas, mas chorávamos
quando alguém sofria; nos amávamos como uma família.
Quem, naqueles dias, poderia imaginar que as igrejas se
transformariam em mega-empresas, movimentando somas
astronômicas, conspirando pelo poder político e disputando, em
pé de igualdade, a hegemonia da mídia?

Fonte: Introdução do livro O QUE OS EVANGÉLICOS(NÃO) FALAM De Ricardo Gondim Related Posts with Thumbnails
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